🚀Travessias e travessuras: Sobre a infância, adolescência e escuta
Nem sempre o que chamamos de “fase” é apenas uma etapa.
Às vezes, o que a criança vive é um enigma que resiste à pressa de nomear — e à urgência de corrigir.
A adolescência, por sua vez, é menos uma ruptura do que uma reorganização do sentir.
É quando o corpo muda antes que a palavra consiga acompanhar. Quando o afeto se intensifica, mas o sentido ainda vacila.
Muitos sintomas que preocupam — irritabilidade, silêncio, agitação, desinteresse — podem ser, na verdade, modos de pedir algo que ainda não sabe ser dito.
Não se trata de “resolver” o adolescente. Nem de “controlar” a criança.
Mas de abrir espaço para que eles possam ser escutados sem pressa e sem molde.
Vivemos tempos em que até os afetos parecem precisar performar.
A infância é antecipada, a adolescência apressada, e o sofrimento — cada vez mais precoce — é muitas vezes tratado como falha individual.
Mas não há sofrimento que surja no vazio.
Todo sintoma aponta para algo que não encontrou lugar na palavra, no corpo ou no laço.
Por isso, escutar uma criança ou adolescente é também escutar seus contextos, suas famílias, aquilo que incide e se repete.
Não se trata de uma “irregularidade” mas de uma “regularidade inesperada”.
É reconhecer que ninguém cresce sozinho — nenhum sofrimento é sem história — ainda que ela não se diga de imediato.
Talvez a pergunta não seja “o que ele tem?”, mas “o que nele está tentando dizer algo que ainda não sabemos escutar?”.

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